domingo, 4 de maio de 2014

SELVA DE PEDRAS

O gato, faminto e exausto, a procura de aventuras e algo para comer a fim de manter sua sobrevivência, naquele famoso momento dos “cinco minutos de bobeira” que todos temos na vida, nem se deu conta que havia se distanciado de seu habitat natural e se encontrava em uma zona estranha e perigosa. De repente, viu-se diante de um bando de cães raivosos, com caras de poucos amigos e loucos para o esfolarem vivo.
            Inevitável. A perseguição foi feroz e implacável e o gato, já no limite das forças e da fome, estava a ponto de se entregar quando, de repente, rolou por um barranco e caiu num rio. Foi como sair do espeto e cair na brasa, pois do jeito que estava fraco fatalmente morreria afogado, já que, a correnteza o puxava para o meio.
Porém, seu destino de morte ainda não havia sido traçado. Numa das margens do rio havia um grupo de ratos a procura de alimentos e, percebendo a situação do pobre felino um deles sugeriu:
--- Vamos salvá-lo!
            A resposta veio em coro:
--- Está louco? É um gato! Se o salvarmos acabará nos comendo!
--- É uma criatura. Temos que salvá-lo --- teimou o bondoso rato.
            E, com sua insistência, conseguiu a ajuda de alguns amigos para executar a tarefa heróica e solidária.
            Pularam na água, nadaram até o bichano. Viraram daqui, puxaram dali e, depois de muito esforço o levaram para a margem. Porém, o local onde aportaram era cheio de pedras, galhos e outros obstáculos. Assim que o gato tateou o chão e percebeu que estava seguro encarou aqueles suculentos ratos à sua frente e não pestanejou:
--- Me perdoem, mas terei que comê-los agora.
--- Fomos exaustivamente avisados! --- gritou um dos ratos acuados entre as pedras.
--- Eu só estava tentando fazer o bem. --- disse o rato que liderou a equipe de resgate já com quase metade do corpo dentro da boca do gato.
            Moral da história:
            Em qualquer situação o bom senso há de prevalecer, pois barato ou caro, sempre pagaremos um preço pelas nossas atitudes.
            Mesmo quando essas atitudes são para fazer o bem a alguém.
(Toninho Portes)

HOMEM. IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS.
            O ano poderia ser 2010, 2020 ou 2030. Isso pouco importa. A época não faz diferença, o fato é que o homem apertou o botão de “Enter” do computador e ficou aguardando a máquina montar mais um robô.
Depois da revolução tecnológica e da robótica a rotina era essa, máquinas fazendo peças, montando máquinas, tomando cada vez mais o lugar do homem. Algumas já falam, outras dançam, fazem o trabalho doméstico, tarefas que atendem as necessidades de pessoas idosas e das deficientes. Tem máquina para fazer tudo. No pouco tempo de espera da montagem de cada exemplar de robô o indivíduo ia questionando onde essa situação ia parar?
            Na sala totalmente limpa, quieta e sem a presença do homem os braços robóticos iam, dentro de um tempo pré - determinado, encaixando cada chip, cada sensor, cada cabo, cada peça em seu devido lugar e, dentro da sala de comando de operações o homem, observando cada maquina que saia pronta no final da esteira de produção, pensava: “Em pouco tempo estarão conversando entre si, quem sabe, até se reproduzindo e nós, humanos, onde ficaremos nesta história?”.
            De repente a porta da sala se abre e nela aparece um robô cilíndrico, movido por um sistema de esteiras laterais, com dois braços que nas extremidades trazem um pequeno bolo confeitado e no lugar da cabeça um monitor em cuja tela aparece uma mensagem para o sujeito dizendo: “FELIZ ANIVERSÁRIO MEU AMOR. NUNCA SE ESQUEÇA QUE EU E AS CRIANÇAS TE AMAMOS MUITO. AGUARDAMOS ANCIOSOS SUA VOLTA PARA CASA. BEIJOS. TAMIRES”.
            Sem conter a emoção o homem apertou novamente um determinado botão na mesa de comando e os braços robóticos que trabalhavam impassíveis naquela sala de silêncio sepulcral iniciaram a produção de uma nova série de máquinas e, enquanto relia a mensagem enviada via internet por sua esposa, companheira inseparável de tantas batalhas na vida e começava a degustar o bolo enviado pelos poucos colegas que ainda mantinham um posto de trabalho na empresa, ele pensou:
 ”Que idiota eu sou. Por mais avançada que esteja a tecnologia, por mais recursos que tenham as máquinas, jamais terão a emoção do aperto de mão de um amigo, do abraço e afeto de uma esposa ou de um filho. Não sentirão a lágrima correr de alegria ao nascer uma criança, não terão a emoção de perceber o olhar de ternura, amor e orgulho de um pai e de uma mãe quando o filho conquista um lugar ao sol através de um diploma ou de um emprego”.
            “Efetivamente, as máquinas jamais sentirão o cheiro da terra molhada num dia de chuva, não dividirão a emoção de ouvir um pássaro cantando, o barulho de uma cachoeira. As máquinas nunca terão a alegria de um almoço ou café da manhã em família, a troca de olhares de um casal nos momentos de paquera, as discussões amigáveis e nunca resolvidas entre amigos nas peladas de fim de semana. É, essas e muitas outras, são coisas que as máquinas jamais terão, mesmo porque, ao criar o homem sua imagem e semelhança, Deus em sua infinita misericórdia jamais deixará que uma máquina sobreviva sem que tenha um homem por trás, ou seja, onde houver uma máquina para trabalhar haverá também um homem para programá-la ou, no mínimo, para apertar o botão de liga-desliga”.
            Depois disso, o colega que o renderia no posto de trabalho chegou. Ele se levantou, deu um abraço forte e demorado no homem que ficou sem entender o que estava acontecendo, pegou as coisas de uso pessoal e foi para casa terminar a comemoração com sua família.
 (Toninho Portes)